quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Capoeira Rede Social e Preservação

Não devemos nunca esquecer que a capoeira vem do oprimido, desfavorecido e excluído, é arte que representa a vitória e valorização de uma cultura antes marginalizada, escravizada e violentada. Todos temos por obrigação valorizar essa arte. Viver bem e aproveitar tudo que ela possa nos proporcionar como modo de vida e até mesmo profissão, isso não é ofensa, afinal muitos lutaram no passado para que pessoas como eu por exemplo pudessem viver no exterior, constituir família, ajudar parentes, e poder ter acesso a bens de primeiras necessidades ou até os tidos como fúteis.


Acho que Ofensa é aproveitar tudo o que de bom ela tem para oferecer (Não falo aqui apenas das lideranças de grupos, mas dos seus alunos também) e esquecer sua origem e seu valor ancestral, se cada um compreender isso, pensará que ela deve retornar das faculdades, academias de luxo, escolas e das classes com mais condições educativas, financeiras e sem problemas de alimentação e emprego para estender a mão para a enorme quantidade de pessoas ainda no esquecimento social e violentadas de diversas maneiras pelas concepções e velocidade da sociedade moderna.


Um grupo de capoeira pode muito bem formar ideais de acção social, pode ser interventivo de forma direta nos problemas sociais, essa é uma tarefa difícil para qualquer liderança que queira lançar mão a obra neste aspecto, pois é um exercício que demora e custa muito, e que para entrar nas mentes e principalmente na atitude das pessoas que nos cercam nem sempre é passivo, temos de estar preparados para os avanços e recuos, para as vitórias e decepções, mas quando se acredita nesse tipo de ideal, mais cedo ou mais tarde a coisa acontece.

Os dois Joãos, exemplo da humildade e simplicidade da capoeira Claro que existem milhares de maneiras em que um grupo de pessoas pode ajudar, ou melhor ainda, um grupo de capoeira, por exemplo, em toda roda de capoeira pode-se pedir para os nossos praticantes trazerem um quilo de alimento e reverter os mesmos para projetos comunitários, podemos pedir roupa, remédios ou donativos financeiros, podemos dar aulas de graça em comunidades, participar com os alunos no apoio aos sem abrigos, fazer parte das mais diversas campanhas de intervenção Social, para ajudar basta querer.


Devemos também lembrar e procurar valorizar os Mestres mais antigos, os produtores culturais populares e retribuir sem pensar duas vezes, seja de que forma for, sempre que eles precisem, porque se eu assim como muitas lideranças devemos muito do próprio sucesso do trabalho a si mesmos, devemos muito mais a esses velhos Mestres. Vamos ainda, para que nossa arte possa continuar a possuir o valor ancestral, dizer não a cópia de CD´s da cultura que destrói a sobrevivência e produção da nossa arte, diga não ao aproveitamento das limitações financeiras de muitos Mestres para acender a “Mestrias” ou ter acesso ao saber e o aproveitamento deste mesmo saber sem nenhum tipo de escrúpulo, diga não em viver depreciando todos os que não fazem parte dessa onda de estética, cultura do corpo, e a dita “Técnica”, diga não a um único modelo musical da moda que sufoca o improviso o aprendizado oral e a diversidade que sempre existiu na capoeira, diga não a tentação do crescimento fácil na integração desmedida de “professores ou não” para poder ter mais uma bandeira de país anexada ao símbolo, como se tratasse de um vitória mas que na verdade simboliza a diluição da ligação ancestral do aluno com o mestre e uma total falta de ética para com o outro mestre, pelo menos ligue para ele antes, diga não a filiação por telefone, Internet, fax, Pombo-correio e sinal de fumo, diga não a falta de ética, falta de frontalidade e de respeito ao próximo, diga sim a uma roda de boa energia e a produção cultural, a ferramenta social e a entre ajuda, a rede da capoeira diversificada e a todos os que lutam por um mundo melhor, mesmo que seja esse pequeno grande mundo chamado capoeira.

Artigo retirado do Portal Capoeira.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Transformação da Capoeira e Inserção no Contexto Escolar




A capoeira, esta arte de origem controversa e que ainda desperta muita polêmica, emergiu no bojo das camadas populares e adentra as instituições públicas e privadas de forma arrebatadora e efusiva, sendo capaz de em pouco mais de quatrocentos anos de trajetória estar presente na maior parte das escolas, clubes, universidades, academias, dentre outros, se firmando com força em vários países do mundo, força esta, que ora estamos precisando verificar, os interesses ideológicos que estão sendo defendidos nas entrelinhas de sua expansão pelo mundo. Partindo dos princípios de que a capoeira, ao longo de sua história, passou por uma série de transformações para firmar seu espaço no ambiente escolar e que a escola funciona, na maioria das vezes, como um aparelho ideológico do estado, que por sua vez estará sujeito aos ditames do capital, tentaremos aqui traçar um painel desta dialética relação entre a capoeira e a escola

    Para compreender os conflitos desta relação, precisamos lembrar que o surgimento da escola teve suas bases associadas a uma estratégia de manutenção da diferença entre a classe operária e a classe burguesa, sendo esta última beneficiada pela manutenção ideológica garantida pela escola, pois ali estariam garantidos os princípios de construção da separação entre fazer e pensar, corpo e mente, etc. 

    Todo sistema de ensino da sociedade capitalista assenta no racionalismo burguês, ou seja, um idealismo ou iluminismo que esclarece os espíritos, a massa e a matéria. Toda a sociedade dividida em duas classes é necessariamente idealista: a elite esclarecida dita as normas, e a massa bruta deve segui-las sem discussão. 

    A partir da análise deste contexto acima, fica fácil compreender o tamanho do "desafio" e das transformações, que foram "necessárias" para enquadrar a capoeira na lógica escolar, pois a capoeiragem historicamente foi também símbolo de contestação da lógica vigente e sua fundamentação filosófica, centra-se em uma simbologia que extrapola o conceito de educação escolar, ratificando o verdadeiro conceito de educação, que não estabelecem fronteiras, nem limites para as relações de ensino-aprendizagem. 

    Segundo DANGEVILLE (1978): Quando a escola é a aldeia, a educação existe onde não há escola e por toda parte pode haver redes e estruturas sociais, de transferência de saber de uma geração a outra, onde ainda não foi sequer criada a sombra de um modelo de ensino formal e centralizado. Porque a educação aprende com o homem a continuar o trabalho da vida. Á vida que transporta de uma espécie para outra, dentro de historia da natureza, e de uma geração a outra de viventes, dentro da história da espécie, os princípios através dos quais a própria vida aprende a ensinar a sobreviver e a evoluir em cada tipo de ser. 

    Deste conceito mais amplo de educação surgem às bases filosóficas dos ensinamentos da simbologia da capoeiragem. Assim fica fácil compreender o tamanho do abismo entre a matriz norteadora da capoeira e a forma na qual ela se apresenta hoje nas escolas. 

    Portanto, a capoeira ganha uma nova roupagem que abre a possibilidade de institucionalização da mesma, pois pela primeira vez a sociedade reconhecia e decodificava os símbolos que fundamentavam a prática de ensino da capoeira, por meio de um método sistematizado e escrito que poderia facilmente ser implantado em diversas instituições, fato este que aliado a uma conjuntura política que estimulava ideais nacionalistas pela forte influência do "Estado Novo" de Vargas na defesa de um modelo de ginástica que pudesse ser genuinamente brasileiro, impulsionaram um grande crescimento e divulgação da capoeira. Um outro fator que contribuiu muito para a expansão da capoeira institucionalizada foi à condição desta alternativa apresentar-se como uma possível tentativa de cooptação e controle de uma arte que insurgisse de forma subversiva em alguns pontos do território nacional, a exemplo das maltas do Rio de Janeiro e de outros pequenos movimentos de contestação da estrutura social vigente, que tinham na capoeira um braço de luta, ou seja, é importante lembrar que esta aceitação teve um preço alto, pois, a necessidade de atender os anseios de uma classe social dominante, enquadrou e remodelou a capoeira em um perfil alienador, que em última instância desarticulava sua simbologia metodológica revolucionária e a colocava a serviço do sistema. 

    A partir desta transformação, a capoeira gradativamente vai inserindo-se no contexto escolar, podendo-se atribuir ao Mestre Bimba um papel importante neste processo, pois através de seu contato com estudantes universitários de Salvador, que o convidaram para ensinar na pensão onde residiam, o mestre pode ter acesso a uma camada social e a códigos e símbolos do conhecimento científico que possibilitaram a criação e sistematização deste novo modelo de ensino da capoeira. A partir daí a capoeira inicia seu processo de institucionalização. O novo modelo de capoeira criado por Bimba e seus discípulos passa a ser reconhecido paulatinamente pela sociedade civil, sendo inclusive o Mestre Bimba agraciado com o título de Instrutor de Educação Física, mediante diploma oficial assinado por Dr. Gustavo Capanema, o então Ministro de Educação, no ano de 1957 pelo enquadramento do ensino da capoeira na legislação vigente. Apesar dos avanços proporcionados por Bimba, o mesmo só teve acesso a uma única instituição, que foi o CPOR (Centro de Preparação de Oficiais da Reserva), na qual ministrou aulas de capoeira para os aspirantes da reserva. Este fato denota que a capoeira institucionalizada inicia-se com M. Bimba, mas só vem se firmar com o passar dos anos, através de outras iniciativas promovidas por seus alunos. 

Fonte: www.capoeiranaescola.com